domingo, 20 de junho de 2010

Mal do tempo


Há uns três anos, li um texto de Chaplin no perfil de uma amiga que dizia:

"A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina. Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida feliz está em percorrê-lo todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso. Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria.
Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara pra a faculdade. Você vai pro colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando...E termina tudo com um ótimo orgasmo! Não seria perfeito?"

Mais do que nunca vejo algo de genial neste texto. Algumas vezes, envelhecer pode ser muito cruel. Como depois de uma vida inteira de luta com a família, de muito trabalho e responsabilidades, alguém que sempre havia sido sinônimo de segurança para as pessoas ao seu redor, alguém que sempre foi capaz de ajudar a qualquer um em qualquer situação pode simplesmente esquecer-se de como fazer as coisas mais simples, errar ou não se lembrar constantemente do nome dos próprios filhos, sentir-se deslocalizada dentro de sua própria casa? Isso pra não falar em coisas ainda mais estarrecedoras.
Como entender que possa ser necessário fazê-la reaprender a andar apoiando-se em braços de pessoas que um dia aprenderam a se equilibrar com ela? A inversão de papéis é tão evidentemente necessária, que dói. Ensinar a quem te ensinou: pode parecer um dever de gratidão absolutamente normal, mas isso só em teoria. Na verdade torna-se uma dor tão estranhamente latente, que é melhor ignorá-la e tentar 'se divertir' com a situação.
Acima de tudo, como aceitar tudo isso?
E como aceitar que, em meio a tantos avanços tecnológicos e médico-sanitários, tantas descobertas a todo tempo, não haja nenhuma terapia sequer capaz de conter ou diminuir o ritmo do avanço de tamanha crueldade? O cérebro é mesmo algo instigante, há um mistério ali gritando para ser desvendado sem haver quem tire conclusões certeiras. Pra mim, absolutamente obcecada por estudos científicos, pesquisas, soluções, medicamentos, cura, toda essa mágica que envolve a saúde, é inadmissível e ainda mais doloroso ver tal situação agravando-se sem que ninguém possa intervir de nenhuma maneira.
;/

Sim, acho que essa é a primeira vez desde a reinauguração do Blog que eu posto algo absolutamente pessoal sem ser metaforizado ou indiretamente dito.

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